terça-feira, 23 de abril de 2019

Reordenamento da Política de Assistência Social em Franca

As normativas da política de assistência social, principalmente as Resoluções do Conselho Nacional de Assistência Social (Cnas) no 109/2009 e no 16/2010, que tratam da tipificação nacional dos serviços socioassistenciais e da definição dos parâmetros nacionais para a inscrição das entidades e organizações de assistência social, provocaram, a partir de 2010, um debate entre as unidades estatais, as instituições parceiras, o órgão gestor e o Conselho Municipal de Assistência Social (Cmas). Isso resultou na definição da rede do Sistema Único de Assistência Social (Suas) do município de Franca e na adequação das inscrições no Cmas.

Neste momento, algumas ações historicamente desenvolvidas e cofinanciadas pelo poder público receberam denominação de serviço tipificado por apresentarem características semelhantes às descritas na Resolução Cnas no 109/2009, mas sem alterações significativas na metodologia do trabalho e ainda sem referenciamento às unidades estatais. Algumas instituições que desenvolviam atividades muito diversas das tipificadas continuaram a receber apoio financeiro do município, mas sem integrar a rede socioassistencial e sem inscrição no Cmas.

Esse processo foi lento e gradual, sempre com a preocupação de não promover interrupções no atendimento à população e respeitar as instituições parceiras que historicamente assumiram a assistência social. Contudo, o órgão gestor tomou medidas necessárias para garantir mudanças imprescindíveis na implementação da assistência social como política pública de direito, assumindo sua responsabilidade de organizar e coordenar o SUAS no âmbito municipal.

Em 2011 houve ajustes nas nomenclaturas das ações de contraturno escolar para crianças, adolescentes e no Centro de Convivência do Idoso (CCI) da Proteção Social Básica (PSB) e nos acolhimentos para idosos e crianças convalescentes na alta complexidade. No ano seguinte (2012), observa-se que as instituições que executavam ações relacionadas a outras políticas setoriais foram remanejadas da rede socioassistencial para uma rede de apoio, ainda recebendo recursos financeiros municipais sob a gestão da Secretaria de Ação Social (Sedas) para execução de suas atividades. A partir de 2013, foram implementados serviços no domicílio tanto da PSB quanto da Proteção Social Especial (PSE); na alta complexidade, o serviço denominado “República para Idosos” deixou de compor a rede por decisão dos diretores da entidade executora, que optaram por manter o empréstimo de moradias aos idosos sem adequação ao serviço tipificado.

As alterações em 2014 foram mais consistentes: descentralização de 250 vagas do Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos (SCFV) para crianças e adolescentes; migração de três ações que estavam na rede de apoio para a política de saúde; serviços de medida socioeducativa de liberdade assistida e prestação de serviços à comunidade bem como acolhimento institucional para adultos e famílias, passaram de execução direta para a rede parceira; implantação de novos serviços de PSE por meio de chamamento público. Reordenar a política de assistência social no âmbito municipal é reorganizar a oferta dos serviços, programas, projetos e benefícios considerando as deliberações das conferências, a realidade do município e as normativas nacionais. A Gestão 2013-2016 estabeleceu como diretriz o avanço nos conceitos, nas dimensões políticas, culturais, sociais e econômicas e na construção de uma política de direito para romper com as práticas de caráter clientelista. O órgão gestor considerou alguns aspectos norteadores para o reordenamento:

  • Unidade conceitual e metodológica.
  • Referenciamento dos serviços às unidades estatais.
  • Alcance do impacto social esperado dos serviços.
  • Territorialização.
  • Integração e articulação da rede socioassistencial. 
  • Identificação e alcance da população em situação de vulnerabilidade, risco e violação de direitos.
  • Cofinanciamento (equalização, equiparação de pisos, definição de custo dos serviços, financiamento integral).
  • Qualificação dos profissionais do Suas. 


O processo do reordenamento vem constituindo-se por meio de muitos debates e disputa de concepções, com alguns avanços no âmbito teórico e da formalidade e outros com reflexos na metodologia e resultados obtidos à luz da concepção de assistência social como política pública. A construção coletiva e dialógica foi a metodologia adotada para a implementação do reordenamento. Foi identificada a necessidade de formação continuada para impulsionar esse movimento. Ainda em 2013, o Instituto Paulo Freire (IPF) foi contratado para desenvolver o processo formativo com a equipe gestora e os trabalhadores das unidades estatais e da rede socioassistencial executora do SCFV.

No processo formativo, em um primeiro momento, realizou-se o debate e a problematização dos diferentes conceitos para todas as equipes das unidades estatais e do SCFV de forma a assegurar o processo de reflexão e ação. No segundo momento, as equipes receberam visitas da assessoria e da equipe de gestão nos espaços sócio-ocupacionais para dialogarem sobre o reordenamento institucional nos aspectos arquitetônicos, teóricos, metodológicos, éticos e técnico-operativos. No terceiro momento, em um movimento teórico-prático, foram construídas as orientações para a Leitura do Mundo por meio da incursão territorial, que foram refletidas com as equipes das unidades do Centro de Referência de Assistência Social (Cras), do Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas) e da rede socioassistencial.

Com base nas discussões de cada grupo, elaborou-se uma proposta de roteiro com cinco dimensões (cultural, ambiental, social, econômica e política) para que pudesse contemplar a participação dos usuários e do SCFV. Cada Cras/Creas estruturou a proposta de Leitura do Mundo de acordo com a sua realidade e organização no território. Esse percurso tem sido realizado com avanços e recuos, mas podemos afirmar que há no conjunto da política social uma intencionalidade de avançar no sentido de atribuir um significado de direito à assistência social. O quarto momento, iniciado em 2015, foi o da construção do plano de gestão do território do Cras, Creas e Centro Pop. Esse momento precisa ser aprofundado permanentemente, tendo em vista a dinâmica do território e a necessidade do envolvimento dos diversos sujei‑ tos que compõe as ações nas unidades estatais. Concomitante ao processo formativo, a Sedas desencadeou várias ações de aproximação dos sujeitos; realizou encontros trimestrais coordenados pela equipe de monitoramento com os trabalhadores e dirigentes das instituições executoras dos serviços da rede socioassistencial; posteriormente, envolveu os responsáveis pelas divisões técnicas de PSB e PSE, bem como os coordenadores e técnicos de referência do Cras e Creas para alinhamento da compreensão dos objetivos, da essência do trabalho, do público, das equipes de referência, da metodologia, do impacto esperado, da abrangência territorial dos serviços, e da construção de fluxos de referenciamento e contrarreferenciamento das unidades.

As equipes de Cras e a Divisão de PSB realizaram encontros mensais para discutir cada uma das ações previstas nas orientações técnicas e alinharam a compreensão metodológica e operacional estabelecendo um plano de trabalho que pudesse orientar os profissionais instituindo metas e ações definidas coletivamente. Podemos destacar como principal desafio a priorização de ações coletivas e de acompanhamento em detrimento aos atendimentos individuais vinculados à concessão de Benefícios Eventuais e inserção em programas de transferência de renda. Identificou-se aí a necessidade de estabelecer uma equipe de referência para a gestão dos Benefícios Eventuais e programas de transferência de renda no órgão gestor.

A efetivação das acolhidas coletivas como estratégia para romper com a prática de plantão social provocou nas equipes maior entendimento sobre o papel dos profissionais e sobre o trabalho interdisciplinar e a metodologia proposta no Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família (Paif). Também contribuiu para que a população começasse a entender a assistência social como política pública de direito, motivando sua participação em outras ações e serviços desenvolvidos.

No que refere ao reordenamento do SCFV, o município de Franca, desde a Resolução Cnas no 001/2013, tem coordenado uma força-tarefa para efetivar, até 2017, a inserção de 50% do público prioritário mediante encontros que discutem desde a importância do SCFV até critérios e conceitos para análise e avaliação do público atendido. Em 2014, cinco núcleos de SCFV para crianças e adolescentes foram implantados em locais com maior incidência de vulnerabilidade indicados pelo Cras.

Esses serviços, que nasceram vinculados ao Paif, distinguiram-se dos demais, colaborando para a compreensão da distinção entre SCFV e ações 39 de contraturno escolar. Também foi mais bem compreendida a distinção de SCFV para Idosos das atividades desenvolvidas pelas unidades de CCI a partir do momento em que as entidades executoras adotaram a metodologia dos percursos.

A gestão da política de assistência social se obriga a dar continuidade ao processo de reordenamento observando as normativas e pactos de aprimoramento do Suas, assumindo, assim, um compromisso de implementação gradativa das metas estabelecidas. Ainda no exercício de 2015, definiu-se a reorganização de toda a rede socioassistencial, tendo como referência as orientações contidas na Resolução CNAS no 109/2009 e demais instrumentos jurídicos que indicam a importância da realização de chamamento público como forma de cumprimento dos princípios da administração pública na operacionalização dos serviços da política.


Fonte: Reordenamento institucional da política de assistência social do município de Franca. Franca: 2015. Disponível em: https://www.paulofreire.org/download/Livro_Franca_2015.pdf

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